domingo, 3 de fevereiro de 2013

Poeta das Cinzas


Poeta das Cinzas (Por Jefferson Acácio)



Há quem diz que o poeta é uma ave lendária
Embora incendiado em autocombustão,
Renasce das próprias cinzas
Com a força da sua poesia é reerguido!



A poesia é o seu bestiário iluminado
Onde todos os seres reais e fabulosos ganham vida
No mundo paralelo da imaginação
Entre a realidade, o supra-real – nenhuma ilusão!

A poesia é sua pira funerária da imortalidade
Como a fênix em seu dramático ninho de fogo
E fantástico renascimento espiritual...
No virtuoso paraíso dos pensamentos - Está acima da extinção e do casual!

O mundo real foi coberto pela doença capitalista
Capitalizou almas, escureceu sonhos, destruiu a verdade
Subordinaram à existência comprada.
Mataram um poeta dando-lhe distração e penalidade!

Agora o poeta conhece os vermes da putrefação
Assim como você reconhece a morte através do outro que se foi.
Ou quando se desvia do animal em decomposição
Sabe o quanto a morte o incomoda, por isso faz oração!

Um médico legista pode explicar
Em sua percepção da necropsia
Ao dedilhar os órgãos apodrecidos de um cadáver
Um homem padeceu... Quanta apavoração! Quanta maldade!

O corpo consume-se pelas bactérias anaeróbicas
Máscaras os protegem do odor pútrido de suas excreções
O corpo examinado, encontrado numa casa abandonada, é identificado
É o poeta das cinzas, e fotógrafos imortalizam a matéria incinerada!

Há quem diz que a abstinência da poesia causa crises convulsivas
Mas no meu caso, me transformei em fogo - hiperatividade de pensamentos!
Por longos anos os monstros do capitalismo roubaram minha inspiração
Algemas invisíveis impediram-me da escrita e cegaram minha convicção!

Escravizado pela realidade pré-fabricada
Castigado e reprimido pelas horas não-vividas
Prostituindo seu talento por poucos trocados num semáforo!
Perdido no corredor do stress – facção terrorista que molesta toda a humanidade!

O poeta deixou de escrever porque se informatizou
O poeta deixou de ser porque seu coração robotizou
O poeta deixou de viver porque o caos o aprisionou
O poeta deixou de amar, porque não se amou!

Então o sangue do poeta ferveu, inflamou correndo pelas veias
A pele quente expeliu chamas ardentes!
A queimadura aumentava sem que pudesse amenizar a dor
O coração feito brasa, ainda bateu agonizado – sangrou!

Somos produtos da dor – de um corpo cortado nascemos
Bisturis, curetas, agulhas, tesouras – somos torturados para nascer
Depois que o procedimento cirúrgico nos liberta, ainda tem a dor do viver!
E depois que morremos, ainda causamos dor aos que vivem!

O poeta nasce, cresce, reproduz poesia e morre
O poeta se cala, mas seus pensamentos deitam-se consigo.
O poeta não escapa da morte, porque é ritual de passagem
A morte é um xamã que alivia cafaléias e traumas!

Há quem diz que o poeta é apenas uma passagem...
Um portal por onde as poesias fazem conversas entre mundos.
Há quem diz que a poesia só existe quando o poeta sangra
A poesia só se eterniza quando o poeta morre!

Depois que se acabou ainda não se acabou...
Metabolização... Identificação... Notícia... Velório...
Quarta-feira de fevereiro, desmancho no deserto pueril das almas...
Espalham ao sopro sutil do vento – as cinzas de um poeta!