quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

UMA MERA QUESTÃO DE COMO SENTIR

Por Jefferson Acácio

­Quem nunca teve o prazer de experimentar
as coisas mais simples do mundo irá compreender
a falta do que é não tê-los por longo tempo
Por quinze anos estive num completo exílio
firmado há mais de 10 mil metros de profundidade
Não sabia nem a referência de tempo
exilado num oceano absurdamente escuro
sem conhecer a luz da superfície e as belezas terrestres
Ainda ameaçado por habitantes de vida marinha
Que sequer eu sabia que tipo de organismos eram
Mas sentia que eram ameaças ao meu habitat
porém protegido por uma espécie de manto ou placenta
que apresentava funções sensoriais em forma de
uma massa gordurosa, de musculo mole, visceral...
me trazia oxigenação ali chamado de trocas gasosas
e capturava alimentos de onde não se imaginaria encontrar
De repente naquela escuridão gélida, ao mesmo tempo morna
sombria... claustrofóbica... antisocial... nojenta...
toda a vida de certo modo estava ali no enxcerto, em pleno movimento do EXISTIR
E nenhum predador ousaria o êxito de conseguir a captura.
Pois meu exílio era revestido de uma força rochosa, de cálcio, ferro, sei lá...
nada atingia... Exuberante fortaleza...
Quinze anos de minha evolução passei nesse exílio camuflado
como um feto indefeso, em formação genética tardia...
como um feto amedrontado que não quis brotar para a superfície
e sequer conheceu a superfície e sequer teve a natural curiosidade
Ali na minha pequenina prisão de liberdade, onde tudo era místico
onde o todo era um vasto compacto da natureza e perdido no lugar comum
O meu lugar, o meu lar dentro de um mundo exótico, larval, laboratorial...de sentir!
O estágio da minha evolução era observado e sentido pouco a pouco
Em nenhum instante desejava dirigir-me por caminhos estranhos fora dali
em busca de outros substratos necessários e adequados
para completar essa metamorfose
eu queria criar raízes, cordões e nós de fixação até os fins dos meus dias incontáveis
E por aparente desastre um grande predador surgiu em meio à escuridão vazia
tudo se mexia simultaneamente e agressivamente como se quisesse me expulsar
Uma cavadeira com um tecido estranho abriu as valvas da minha moradia
Chamaram esse evento violento de “nascimento” e deram-me o nome de “Pérola”
E também disseram que assim é que somos reproduzidos – como produto da dor
Fui expulso do meu pequeno-grande mundo e forçado a sentir a superfície luminosa
Luzes de efeitos diversificados, incandescente, causando uma cegueira que me fez enxergar
- Sem necessidade de polimento – Diziam ao me observar esfericamente.
Outros terrestres exclamavam – perfeito brilho!
Símbolo do amor, riqueza, vida, perfeição, beleza, brilho...
Assim conheci outras infinidades de pérolas com diferentes identidades e grupos...
pérolas japonesas, australianas, dos mares sul...
De plurais cores cremes, amareladas, esverdeadas...
brancas, negras, prateadas, rosadas, champanhe, azuladas...
Uma porcentagem de formas, redondas, ovais, gotas, botões, irregulares, regulares...
E com toda essa beleza caminhando por joalherias, pescoços, braços, gavetas...
Encantando homens e mulheres, vestidos, bolsas, artigos variados...
e muito além disso, conhecendo a mais profunda escuridão...
e a mais estonteante luz invasora da superfície ...
E quando me deparava em mãos de quem nada tinha para comer
tendo a jóia como a saída para suprir a fome avassaladora e real
E quando me deparava em mãos de quem outras joias exibia em abundância
tendo a jóia como mais uma da coleção para suprir a fome avassaladora e real
No poder dessas mãos, numa eu era a jóia preciosa como o pão da vida
Noutra eu era a jóia roubada, a prova de condenação como a culpa que mata
Noutra eu era a jóia do poder, da vitalidade, da supremacia...
pronto para ser exibida a qualquer momento e conservada por tradições
Em todas essas e situações senti-me como num outro estágio inacabado
E a jóia aqui nada mais que exibe o simples fato inevitável – A VIDA.
Há quem rejeita ou não teve a chance de senti-la em suas profundidades.
Na luz ou escuridão, é uma mera questão de como sentir!



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