segunda-feira, 19 de novembro de 2012

ACOSTUMADOS ÀS SOMBRAS




 (Por Jefferson Acácio)

Aquecidos por um cobertor de sombras, dormimos e acordamos
Um belo tecido de um material pré-fabricado
Bem arranjado em unidades coesas e justapostas vive
É o tecido epitelial que cobre nossas feiuras
E expõe os pelos de animais sedentos por vergonhas
A vergonha não mais habita em nossa pele, não porque fomos perdoados
Pecado e alma parecem indissociáveis e consumam a carne por constrição
A boca parece cúmplice das nojeiras praticadas pela nossa raça. Humana?
A boca suja profana a mentira e modela uma aparência dissimulada
A mentira delicada costura um manto em forma de terceira pele.
Vestimos a pele de múltiplas aparências.
Não sei... Sou o poeta das asneiras convivendo com essa língua fulgaz?
Ou estou com sintomas de desvio da personalidade?
Não me sinto parte do todo, vezes nem mesmo me sinto parte de mim.
Sinto meus dedos tocarem as paredes de morfo na cidade morta
Sinto meus pés descalços escorregadios na lama alojada nos asfaltos
Mas não me sinto contido. Faltam mais exílios no mundo para convívio com a luz!
Sei que por volta há sombras espreitando meu despertar.
Sombras vivas espalham a penumbra como um vírus alastrador.
E por ironia, não percebo pessoas assoladas, pelo contrário...
Há em todo canto pessoas acostumadas
Ou o leitor esperava uma narração de filme de terror?
Quimera que a dor estivesse exposta para um melhor prognóstico
Mas as dores estão escondidas ou o prazer se confunde com a dor
O que vejo exposto é um sorriso vagabundo de viver
Escondem as marcas debaixo de maquiagens e plásticas?
São chagas invisíveis ou não existem?
Por linhas certas não sei dizer
Mas tenho pressa em estancar os pensamentos fugazes. Sangram em minha mente!
Quase não encontro sinais de clemência nessa terra.
Até os pedidos de misericórdia parecem encenados
Para não vulgarizar ainda mais o estranho acomodamento
Prefiro aceitar minha condição como um desalinhado no espaço
Cujo diagnóstico acusa-me de “poeta das asneiras”!
Estupidamente, eu me denuncio como um limítrofe, extremista e caótico poeta
Se ao meu redor há um mundo regulado, então sou eu o desregulado
Sou eu quem não se acostumou e quem despersonaliza a realidade
Baseado em pensamentos transtornados, caso clínico de borderline
Fora da realidade, me vejo com olhos de relâmpagos incandescentes
Enxergo a realidade desfigurada de indecências
Meu epitélio conjuntivo repele-se de pavor
Um formigamento perturba a minha matéria viva repugnada
Expulsei de mim o prisma da convenção social para resolver problemas de astigmatismo
E como castigo contrai a síndrome da verdade perturbadora.
Assim, por entre as sombras caminho desolado pela cidade
Doente das ideias, não denuncio com alto-falantes, pois uso as palavras quietas
Que saem quase silenciosas senão fosse o barulho dos dígitos no teclado
Balbuciadas entre os lábios febris sentem vontade de gritar
Nas calçadas, respeito às sinalizações para não sofrer acusações de indeliquência
Mas incontrolavelmente atropelo-me entre as palavras desconchavas
Porque estou sempre atento farejando por elementos de estudos
E encontro, afinal, numa esquina, mortas-vivas fitando o céu em plena sombra do dia
Parecem que os olhos esperam um milagre do alto.
Mas o próprio céu inconformado suplica por azul e procura na terra a pintura alternativa.
Solidárias as árvores sacodem para emprestar o resto do seu verde
As nuvens se esforçam com os mares para misturarem na paleta e colorir novo planeta
E por todo canto nenhum pintor de mãos limpas para retratar e retratar-se com o mundo
Das galerias da cidade, somente sombras que diminuem as horas do dia
A cor vermelha ainda sobra e irrita com sua alegria pela reprodução
Com suas “crias” descalças na dura lição de viver na penumbra
Aprendendo a acostumar-se com as sombras desde cedo
E eu, aprendendo a acostumar-se com os acostumados.
Constante alergia!

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