sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Avenida dos Quinhentos Navegantes!

Por Jefferson Acácio






Eu mergulhei nos poços de várias pessoas e havia felicidade lá
Eu andei sobre a avenida dos quinhentos navegantes
Um mar de gente furiosa e agitada
Euforias, ritmos e percussões aleatórias
Eu mergulhei nesse oceano complexo

São oceanos metafóricos dentro de cada um de nós
Somente lá se encontram ribeirões de felicidade
Precisa dar um salto confiante para esse mergulho
Como fazem os moleques nos altos rochedos
O impacto é forte, mas libertador!

... Prisões pessoais, catastróficas e desequilibradas
Quando saltamos e navegamos em nosso próprio oceano
Descobrimos avenidas antes nunca visitadas por nós
Esta é a Avenida dos Quinhentos
Poucos são os corajosos
Depois do mergulho, o corpo emerge das profundezas
Vê-se mais claramente o brilho do sol
A mente é o barco, as atitudes o leme e a alma o oceano!

Não se lamente por não conhecer seu oásis
Apenas mergulhe por endereços privados onde sua felicidade o espera
A felicidade é tão sua quanto imagina
É tão real quanto se pensa que sonha acordado
Mergulhe... Habite nos recantos do seu interior onde a presença da felicidade reside de verdade!

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Uma luz

Por Jefferson Acácio
Foto ilustração



Luz no meu corpo!
Preciso de luz para escrever essa poesia
Preciso de uma iluminação ambiente
Filtrando cada camada do meu epitélio
Quero uma luz débil, calorosa, cheia de vivacidade
Uma luz que não produz sombras
Luz forte, econômica, fluorescente...
Preciso de uma luz assim ó... Cinema!

Luzes, câmera, ação!




Luz que ultrapassa paredes, esponjas e arrebatadores
Luz mágica, mitológica, mística
Que recria a sensação de congelamento, dispersão...
Luz da noite, luz do dia, e luz de um olhar
Que faz evaporar minhas lágrimas
De efeito 3D? De infinitos D’s, pode ser?!
Luz que registra cada momento como um flash eficaz
Luz que rompe as leis da física
Luz que me envolve num campo eletromagnético
Formando um invólucro por dentro e por fora de mim
Revestindo o meu coração, pulmão e cérebro
Luz que é minha armadura e meu escudo
Que estimula minhas células fotossensíveis
Luz que é minha visão, minha lente, meu prisma
Luz que chamam de fé, milagre, saída, passagem

Vida!
Simples luz...
Luz!
Luz?
Ué, apagou?



quarta-feira, 6 de outubro de 2010

* Cédulas, Amores e Abismos

Por Jefferson Acácio



Atenção: Antes ou depois desse texto leia Anônima, Café e Melodia (é uma continuação)

“Custa caro senhor! Senhor, Senhor... Senhor!” repetia o garçom ao pé do meu ouvido e, ao mesmo tempo, todos os ruídos de vozes das mesas sumiam, as luzes desciam lentamente e o grupo de músicos daquela noite também desaparecia com o “chorinho. A penumbra envolveu tudo numa cortina de fumaça. Ficou apenas eu, o balcão, meu chope e o belo par de pernas da moça que acabara de entrar no bar e restaurante Tartarugas.

Levantei o chope apontando em direção à jovem que acabara de entrar no bar. Inclinei a cabeça em forma de admiração e bebi uma cascata do chope – sem tirar o olho de suas pernas. Minha garganta estava regada do líquido gelado diluindo o álcool na minha corrente sanguínea. Silêncio total, até mesmo a própria respiração.

Foram longos dias prezo no apartamento. Eu estava totalmente decadente após uma surpresa desagradável: Uma garota bailarina havia destruído em mim o que restava de credulidade nisso que chamam de paixão. E mais uma vez estou aqui a remoer o ódio e a culpa por colocar o próprio coração nesse cárcere privado. Essa garota surgiu quando eu me sentia um velho fracassado que entrou numa jornada ao grosso estilo Indiana Jones, porém mais para um alpinista desconhecido do que um herói. Um aventureiro aparentemente destemido portando um coração arqueológico escalando o monte mana no Himalaia. fantasioso, não é? Era assim que eu levava a vida esperando no tempo para entrar numa história fantástica digna de roteiros cinematográficos de amor ou inspiração para alguem que traduzisse em arte.

Nem acredito nas minhas próprias atitudes, me sinto um patético solitário avassalando corpinhos esguios de moças recém chegadas na fase adulta e carregando o espírito desbravador, sonhador e irreverente da juventude. Sentia-me um herói protetor, sempre de peito e braços abertos, imensos olhos, muita luxúria nos lábios, mãos paternais e feudais. Quem sabe até em vidas passadas eu debulhava as cavidades de “escravinhas”, com todo dengo, claro.

"Sentir" é muito perigoso quando se tem carência exacerbada. Tenho carência do calor humano, especificamente das humanas. A música sempre esteve muito presente sombreando meus passos. Como pianista, eu busco nas pessoas as melodias que elas precisam ouvir para sentirem-se seguras de que tudo está bem. Provo para as pessoas que o coração bate forte só pra anunciar que ainda funciona e não por exprimir dor e felicidade, pois estas são engendradas no próprio sistema nervoso.

Foi numa noite metropolitana de sexta-feira como hoje,um inverno estranho, com chuvas e uma brisa quente angustiante que conheci Ligia Matarazzo, a tal, ela mesma, avassaladora. Exatamente essa mesma angustia que contamina meu corpo ao pronunciar seu nome. Sinto calafrios. Meus impulsos me levaram à sombria caça por uma noite de prazeres imediatos, prática comum entre tantos  outros solitários. São meus refúgios das dores acumulativas de cada paixão, uma morte lenta e letal! Uma vez morto, nunca mais me permitimos amar e ser amados, só aos nobres corajosos ficam essas façanhas. Mas ainda estou vivo para tentar.

Expressivo nome para uma garota de vinte e dois anos, brasileira de descendência italiana e uma estonteante miscigenação com a matriz africana, bailarina, cândida e convidativa. Eu precisava senti-la e não sei ao certo se a senti, mas é possível que ela tenha sentido o meu “eu” muito mais, sem maliciosas entrelinhas. De fato, eu a toquei com todo o meu corpo, cheguei a acreditar que fossemos uma mistura homogênea não destilável!

Ela castigou-me de todas as formas, me deixou construir sonhos ao seu lado e no dia seguinte simplesmente partiu. Eu ainda a chamava de minha “bela adormecida de Tchaikovsky”. No dia seguinte eu fui cruelmente desperdiçado como a sobra de uma comida estragada. Quem já provou desses dissabores da vida sabe bem do que estou falando. Esse incômodo, é de uma dor tamanha que poderia comparar ao coração retalhado num açougue de quinta categoria. Há quem diz que essa minha franqueza límpida, doentio, e sensível não é própria para os homens do diminutivo aglutinador "macho". da espécie dos meros reprodutores. Mas esse forte aperto no peito não passa de uma farsa engendrada no meu cérebro. Queria acreditar no que falo.

Ela havia recuperado minhas esperanças. A esperança? É como ver uma rara borboleta azul no meio de uma metropole caótica, sombria e poluída. Naturalmente deveria ser encontrada em lugares quase inacessíveis ao homem, em pequenas e camufladas áreas tropicais, mas é vista sobrevoando a cidade arrebatando nosso conceito sobre o "impossível".

Hoje quem sabe outra esperança incide novamente no meu peito hibernado e afagado nos vícios alcoólicos. Eu sempre fui um bom freqüentador do Bar Tartarugas, até me apresentei algumas vezes. É uma atmosfera de boemia, distração, um clima intimista, com focos de luzes vermelhas nos cantos induzindo as pessoas a deixarem os estímulos sexuais aguçados com as bebidas e o belíssimo repertório dos músicos. É um local indispensável para saciar ao menos o desejo de um delicioso drink e quem sabe levar uma companheira de brinde para casa.

Como de costume, eu troco conversas com os garçons, revejo amigos, confidenciamos nossos truques de raposas. Falamos de política, futebol, mulher e até mesmo de novelas. E quando não encontro os amigos, eu fico sozinho no balcão, onde aprecio as atrações musicais que enfeitam o palco. Faço bom proveito do momento para assistir a linda vida alheia. Já que a minha não está muito interessante para a telinha.


Recordo-me de como conheci Ligia. Eu aguardava o sinal, quando ela atravessou a faixa de pedestre em frente ao meu carro, e pude senti-la atravessando verticalmente pela minha garganta ressecada. Como havia dito, sentir é algo muito perigoso, altamente tóxico, e pode trazer esperanças cegas. Eu via até raras borboletas azuís como o colorido da sua roupa de ballet e a pintura facial. Aquela mariposa mulata, aquela linda borboleta que eu desejei colecionar, capturar, presentear com flores, ela havia fugido para seu ciclo natural: A liberdade imaginada. Ainda me questiono quem fora o predador.

Desde então não bebo mais café, pois me lembra também a sua estratégia de escape, o tom madeira sucupira da pele da minha mulatinha, do nosso encontro no barzinho decadente “Carpas”, da nossa conversa prolongada e da aventura no apartamento. Desde aquele dia, continuo na mesma frenética nota afirmativa de que não foi apenas sexo. Juro que da minha parte não. Ao menos eu queria que fosse mais do que sede, fome, fogo e miséria... Bebidas, culinária, sexo e rompimento... Gole, mordidas, gozo e castigo. Após o climax do gozo, eu também desejei abrir vôo para a liberdade. Liberdade de amar. Liberdade talvez inventada ou surreal. Liberdade que é confundida com prisão.

Três dias com as portas de casa trancadas, um mês de seguidas trepadas insignificantes com outras desconhecidas bonequinhas carregadas de maquiagem. Desculpe a minha porosidade, a falta de sutileza e polidez.Perdi a compostura! Envelheci mais um ano e estou com 43. Envergonhado com o meu reflexo. Pensei em abandonar meu piano envenenado e dedicar mais tempo na minha loja de instrumentos. Um desperdício.

A carência é o meu instrumento de sopro, age na minha mente e atinge o pulmão do qual eu castigo com cigarro, como se não bastasse o próprio ar poluído dessa cidade. Um ano passou e eu me sinto ainda estacionado naquela sinaleira onde avistei Lígia pela primeira vez. Desde então tudo ficou pela metade, café, trabalhos, sorrisos, inspiração, repertório, aplausos exceto os murros no próprio peito! Então dois dias antes de voltar ao Tartarugas, eu recebi uma carta da minha querida mãe Rosalinda. A carta estava suja de teias de aranha da caixa de correio que há tempos o zelador do prédio não zelava. Na verdade, não passava de um relato sobre as pessoas da vizinhança com o objetivo de me incentivar moralmente a encontrar uma parceira para mim.


Ao terminar de ler a carta, senti uma enorme sensação de pecado por estar sozinho. Meus irmãos, tanto que temiam se apegarem a alguém, que constituíram famílias, apesar das crises típicas. Ninguém quer ficar só. Muitos topam qualquer coisa pra não ficarem sós. A carência é um sentimento perigoso, o abismo da vontade, o lugar comum dos abandonados, desprezados e esquecidos. Esta carta não veio numa hora bem-vinda, quando ainda tenho medo de borboletas.

Revirei cartas antigas das minhas paixões traiçoeiras, entre elas, Mariana... (suspiro). Estudamos juntos no Colégio Suzano Alvorada. Enamorávamos na praça da cidade com beijinhos “estudantis” e sinceros... Era carnaval quando firmamos nosso namoro estreado com o nosso primeiro beijo seguido de abraços pueris. Dividíamos os mesmos sabores da vida. O que nos importava era experimentar.

Seu pedido de casamento surtiu após cinco anos de namoro e eu estava prestes a ingressar na faculdade. Era uma fase de idealizações, inquietações e principalmente de escolha. Meu desejo era conhecer outras civilizações, eu idealizava uma carreira exemplar em Medicina ou qualquer outra de status, e me tornei pianista. Mariana riria das minhas convicções. Pena não ter escolhido ela para continuar experimentando a vida. Essa sim é traiçoeira. A vida. Suas surpresas são reveladas depois que tudo passou. Queria viver no passado ou que o tempo fosse sempre o presente de finitas edições.

Cá estou eu e o garçom, divididos pelo balcão, momentos antes da triunfante chegada de uma mulher. Já tomei três caipirinhas, no preço promocional de dois reais, um inteligente chamariz para os habitues da casa. As prostitutas disfarçadas de boas moças estão sentadas às mesas, lógico, convidadas pelos melindrosos senhores de carros importados e cartões de créditos sem limites. Daqui vê-se uma competição entre recordistas: quem mais bebe e quem mais paga.

Olha só o que encontro! Uma nota de cinqüenta reais. Simbólica. Foi propositalmente esquecida no balcão por algum “palhaço” a fim de pregar uma peça em algum “bobo”.  Mas há algo escrito aqui que diz: “Qual o custo da sua felicidade?”. Boa pergunta para um bobo como eu responder. Enquanto eu acendo o cigarro vou pensar numa boa resposta. - Garçom, o isqueiro por favor - As chamas acendem a imagem de uma onça pintada. As “onças” se multiplicam até formar um safári. Então um leopardo carnívoro me avista de longe, e chego até a travar o cigarro entre os lábios. Então ele vem na minha direção com passos silenciosos e astutos, com uma marca no pêlo escrito “felicidade”, e de repente o salto! Quimera eu ser a presa capturada pelas mandíbulas da felicidade! Vou guardar essa nota no bolso.

E continuando no delírio do álcool...Por outro lado a felicidade poderia ser demersal como as garoupas, escondida em algum canto profundo de um oceano. Ou quem sabe fosse baseada na materialidade. Creio que não. Caso fosse, as pessoas se transformariam em moréias venenosas defendendo seus royalties da felicidade. Acho que a felicidade tem uma natureza mais fraternal, mais fundamentada na árvore da família como os micos-leões dourado - os sujeitinhos pequenos de vida social defendem seus territórios apenas com o grito. A felicidade precisa ter graça, precisa voar, e não apenas saltar. A felicidade precisa de asas coloridas e precisa nos fazer serem pessoas lúdicas como as araras. Ou quem sabe como uma garça. Já pensou, se ela pousa nas mãos de um sortudo. Como posso ver, a felicidade estaria então nas mãos de muitas pessoas ou escondida nos oceanos profundos de cada uma delas.

Muita gente devia ser feliz nesse país, nesse continente, nesse planeta. Mas encontrar a felicidade parece ser incoerente ou uma idiossincrasia. As propagandas, novelas e filmes vendem uma imagem de vida social feliz. Há outros felizes que investem na matéria, na carne... Cuidam da estética, do superego, da forma física e dos prazeres imediatos, da vaidade e da luxúria. É um investimento caro que, em suas particularidades, importantes, principalmente quando relacionado à saúde. E em centenas de casos, nos preparamos com a melhor roupa, acessórios e perfumes caríssimos apostando num ritual de atração dos relacionamentos.

Mas ao olhar profundamente cada um, vemos que a maioria não se sente feliz, completos e donos de si. Eu mesmo adoraria ser meu próprio leviatã e não sofrer mais com os sinônimos da depressão: solidão, carência e vazio. Tantos investimentos para no fim da noite ficar sozinho – quantos já não passaram por isso, não é? O quanto você gastou de tempo em frente ao espelho, em salões, lojas, SPA, centros estéticos, cirurgias, academias, regimes, e tal e tal, para merecer alguém, que em alguns casos chega até a dedicar-se a você, mas depois descobrem superficialmente que não era isso que queriam.
Então você se abandona? Então você cria fugas aparentemente positivas? As pessoas verdes temem serem "a presa" da felicidade. O impacto de suas mandíbulas carnívoras realmente assusta. Mas é preciso ter coragem de se permitir diante do próprio medo. As pessoas maduras lamentam por não terem se permitido mais, e vivem a triste culpa de confundirem amor com prisão e trocado a felicidade pela solidão. E quem sou eu para falar dessas coisas. Um solitário cheio de máscaras enrugadas, em delírios, contradições e decadências do espírito.

Resta-me o meu velho escape no Tartarugas em busca de sorrisos fracionados por unidades indivisíveis do tempo. Sorrisos simbólicos e prazeres imediatos. Abismos, Ilusões, prisões pessoais, carências, insônias... Quero tirar do meu corpo e alma estas tatuagens em troca pela mordida da felicidade, mergulhar no oceano perdido dentro de mim, em algum oásis escondido nos olhos de alguém.

Enquanto isso, aqui vai mais gole de inveja, de nostalgias e outro gole é meu remédio. O burburinho de risadas, conversa na ponta da orelha, taças e colarinhos marcados de batom vermelho, perfumes de homens e mulheres, cruzadas de pernas, lambidas no pescoço, piscadas de olhos, um rodopio, dor de cabeça e peço um chope para fechar a conta.


Neste  exato momento, à meia noite, a tal desconhecida entra.Sua beleza parece silenciar tudo para ouvir o som do seu salto no piso de madeira. Eu digo comigo mesmo -"É castigo!". Não era Lígia, era uma nova borboleta! Na minha admiração, o garçom diz “Custa caro senhor!”, mas como não dei atenção, ele insiste “Senhor, eu disse custa caro”, o malandro está debochando de mim.

Um passo dessa nova anônima e uma dor é cravada no meu peito, outro passo e vejo a ponta do vestido longo furtando do lugar toda cor, outro passo e seu par de pernas me causam uma febre interna. Ela chega até o palco, cumprimenta os músicos do chorinho, pega o microfone... Sua boca umedece e deixa escapar a ponta da língua. Seu pulmão se enche de ar para nos deliciar ao som da sua voz e seus olhinhos de gude remetem-me à juventude pueril e sincera. Quando ainda não aprendemos a mentir com alto grau de cumplicidade.

Então respondo ao garçom com vibração e esperança nos olhos – “Não custa caro não rapaz. É um beija-flor!”. E neste instante, imagino o meu beija-flor num lindo coreto, e o tecido do seu lindo vestido soprado pela brisa de primavera, seu corpo nu, seu pulmão elastecendo-se, seu salto alto, e os olhinhos de gude brilhantes. A minha anônima é um beija-flor que veio para transmutar e pairar na janela da minha mente! Cédulas, amores e novos abismos!

quarta-feira, 30 de junho de 2010

Canção particular

Por Jefferson Acácio

Há uma canção que não requer músicos
Uma canção que só nós mesmos ouvimos
Uma melodia íntima e singela, silenciosamente nossa!
Vibrante e incrivelmente poderosa
A canção do nosso viver...
É uma canção que exige do silêncio e da concentração


Observe ao fechar os olhos,
O som da engrenagem do pensamento,
A respiração em forma de percussão em diferentes ritmos
Obedeça a ordem natural dessa canção
Uma cadência repetitiva incessante
Assustada... Serena... Contida...

Imagine por onde seus pés caminharam ontem
Imagine que os pés tivessem olhos de gato
Olhe à altura do chão cabisbaixo como um cão farejador
Explore a beleza de cada imagem minimalista
As poças d’água e os ruídos do cotidiano
Pois é, tudo o que está fora e dentro é a melodia do viver

Linda canção
Que estão destruindo com partituras esquisitas
Linda canção
Da pena de não mais ouvi-la



Emparedado

Por Jefferson Acácio


De frente pra parede
Azulejos amarelados ajustados
E eu ajoelhado em penitência
O chão molhado de pecado

Do corpo escorre o suor pro piso esverdeado
Na ponta do nariz encontro-me com o limite
O muro na minha testa se faz de fronteira
Sinto um abraço desse muro de tinta azul e madeira

Uma força de cimento e areia envolvendo meu corpo
Aqui me conforto das convenções sociais
Dos desesperos e desilusões de cada dia
Esta casa, esta parede, este chão amigo... minha covardia

Emparedado caminho pelas ruas sem nome
Eu de frente pra porta fechada
Reflexo de um espelho no próprio espelho
Um rosto estranho desgastado, com fome

Lá fora uma euforia de futebol e carnaval
A janela aberta e eu preso no quarto
Sinto a culpa social imobilizar minha fuga
Aqui dentro um velório descomunal

A pia e a água no rosto desculpam-se por mim
Somente para amenizar os arrependimentos
Quanta história e progressos jogados pelo ralo
Sigo as sobras na correnteza da descarga, lindo estrago!

Esqueço as horas no silêncio desperdiçado
Lágrimas secas, vidro embaçado
A torneira pingando e o chuveiro ligado
A porta trancada por dentro e o choro bloqueado

Saliva entalada na garganta
Meu país, onde está a minha liberdade?
Santo Cristo Redentor, onde está a verdadeira verdade?
Meus pais, onde está a nossa felicidade?

Palavra Contaminação

Por Jefferson Acácio


Torpes e dilacerados mortais
É de morte, é de Guerra
Esse chão que tu pisa tem pedra suja de sangue
Tudo se enfeita e se modela de mentira
Tu mesmo se rompe e se refaz

Lamaçais e chuvas de vírus
Jorra pra todo lado veneno e perigo
Essa voz que tu ouve é um velho amigo
Olhos castigados de luxúrias
Corpo batizado de prazeres e lamúrias

Hoje é o dia de você olhar pro alto
Uma gota de sangue e aos poucos um choro cai do céu
Na sua fronte, nos seus lábios
Molhando seu corpo inteiro num velório de verdade
Não tem raios, terremotos, nada além de uma chuva

Chove verdades que você não conhecia
Chove verdades que você ignorava
Chove uma contaminação de verdades
Chove Palavra!
Chove Poesia!

Noites de Silêncios

Por Jefferson Acácio

Já denunciei o espelho
Que revive fantasmas
Já acusei as paredes
Que escondem o real de mim

Mas nunca me julguei
Bem ou mal, não pensei
Afinal a verdade do homem
Eu sei - "É a contradição!"

Já me fizeram marcas
Nenhuma delas sangraram
Já me machuquei com flores
Já repeti a dose...

Doze...Treze...Outra dose
E olha eu refletido ali no copo
O espelho me persegue
Eu persigo o espelho

Perseguições cegas, inúteis
Procuro o "eu" no outro
E só o encontro no silêncio
Nas noites nuas, paredes descoloridas e chão frio

Aventuras pelo desconhecido

Por Jefferson Acácio

De repente eu levantei da minha cama com muita disposição. Era uma força tremenda que se manifestava dentro de mim. Eu podia senti-la como se fossem formigas pelo meu corpo. Ao mesmo tempo era uma sensação forte e também era leve. Sim, porque eu não sentia um peso sequer, mais sentia que era forte.

Na minha pele havia essa reação estranha que caminhava como formigas mesmo, acho que transportando a energia da cabeça aos pés. E por dentro, era como se eu tivesse inspirado uma proporção maior de oxigênio. Sentia meus pulmões trabalhando mais rápido pra controlar os impulsos.

E então eu levantei da cama com esse inexplicável poder, “prefiro chamar assim”. Ainda liguei o celular para ver as horas, eram exatamente cinco da madrugada. Abri a porta do meu quarto devagar, caminhei até a sala e por curiosidade entrei nos quartos para vigiar se todos dormiam bem.

Vagarosamente sai da casa e, como um leão, eu observei se algum perigo os ameaçaria. Visto que estavam em segurança, entrei guardando meu urgido no peito carregado de ar. Fui à cozinha, pois havia em mim uma fome de boi, e meu abdômen se contraia inteiro. Comi o que havia na geladeira, e bebi do vinho que guardavam na adega da casa. Então voltei à sala, abri cuidadosamente a janela e subi.

Em frente à janela havia o muro da minha casa, pois eu cheguei ao muro levemente num salto. Olhei para frente e bem longe, com olhos de águia, avistei o mar e as nuvens estavam lindas. Um céu em tons de azul, laranja e vermelho se emaranhavam no despertar do sol. Enchi novamente meus pulmões daquela energia firme e constante e então pensei:

- EU POSSO VOAR!

Foi um levantar de vôo tão seguro de mim, sem asas nem nada. Somente aquela energia que girava ao meu redor, desta vez dos pés a cabeça. A energia estava mais concentrada nos pés, para me dar o impulso do vôo. Voei e lá de cima tudo ia ficando distante. Eu via a cidade do mesmo jeitinho que vemos no cartão postal, tão pequena que podia se vê de um só olho. Uma brisa leve no céu, que me soprava do oeste. Acho que era o vento de Zéfiro.

O gosto de voar era tão grande em mim, que me parecia não haver mais o chão. Enfrentei Bóreas, Eurus e Nótus, afinal tinha que haver os grandes ventos. Assim também os pormenores ventos Kaikias, Apeliotes, Lips e Síroco sopravam em mim. Fiz então um pouso em Constantinopla, cidade mais importante da Trácia. Descansaria por lá para seguir jornada ao Olímpo. Mas ao chegar à cidade não sabia que estava em pé de guerra.

Meu primeiro confronto foi com o deus do caos. Toda aquela desordem e confusão que se gerava na terra de Trácia. Eis que surgia então, em meio à multidão, o deus Eros, filho de Afrofite. E lutando contra o Caos, com o coração flechado por Eros, me vi numa guerra entre a razão e a emoção.

Mas logo, aprendi a desenvolver o equilíbrio e o poder da ordem. Não temi ao caos, nem me entreguei aos devaneios da paixão. Aquela energia era meu combustível de vida, para conquistar novas terras. Vivi mais essa aventura e voei do Olímpo, como Hercules fazia, sempre em busca de novas aventuras promovidas pelo desconhecido.

Ambiente de Guerra

Por Jefferson Acácio






Nosso corpo é constante campo de batalha
Arcos, flechas, espadas e escudos.
Somos primatas prematuros incompletos e impuros
Medo, inocência, credulidade.
Tanto amor no peito acolhe também a maldade

Abraça-me com emergência
Venha para perturbar meu estado de sanidade
Enfrenta minha louca tempestade
Estou numa luta interna de querer você pela eternidade
Mas a ordem social indica que seja pela metade

Ambiente de guerra no peito caloroso
Cortes de beijos secos e tempestades vazias
Na garganta uma palavra morta
Assoalhos molhados, roupa macia, pele desidratada
Meus medos malcriados levam-me a sacristia

Que pena, tantos nomes perdidos na multidão
Nesse exército de fábulas nenhuma fada
Nenhuma paixão avassaladora
Somente a pacificação das vontades vestindo corpos esguios
Eu quero terrorismo de amor invadindo os meus territórios
Quero guerra do amor vencendo a minha carne

Alice

Por Jefferson Acácio

Conheci Alice
Vou com Alice
Não volto com Alice
Na fantasia me jogo com Alice
Iludir-se por amor não é tolice

Aprendi nos tempos de meninice
É bom ter um amor que me enfeitice
Vou correr, pular e cair na sandice
Se amar é uma ilusão, uma ceguice...
Prefiro ainda ser a própria ALICE!

quinta-feira, 3 de junho de 2010

* Insônia, Pânico e Silêncios

Por Jefferson Acácio

É um engano acreditar que as madrugas foram feitas para o silêncio e para o sono. A madrugada é para os oprimidos. Durante o dia é um congestionamento de pessoas e automóveis, uma poluição de sons de todas as origens. E tudo se expressa e faz ruído ao mesmo tempo, competindo até mesmo com o nosso próprio pensamento. Então chega finalmente a madrugada e... Preste bem atenção... Lá fora...

Uma sacola dançando na pista da Rua dos Aflitos. A sacola plástica é carregada pelo vento que bate nas janelas e portas convidando para assistir ao espetáculo. O vento agressivo parece não ter força para atirar longe a sacola que voa levemente e dança sozinha um ballet clássico no asfalto, na calçada e arrastando-se de baixo para cima, de cima para baixo nas paredes das casas do bairro.



As janelas de vidros sambando frouxas, e as portas rangendo com os sopros frios e juntas emprestam um ritmo incessante de suspense ao vôo da sacola. Tudo parece um delírio, mas é uma grande orquestra. A cadência contínua é incrementada com o remexer de plásticos, garrafas e latas. O ruído produzido parece ser de algum rato revirando os lixos domésticos. Ou talvez um rato vestido de trapos, coitados, eles buscam os nossos desperdícios. E dentro de casa, os ratos fazem uma festa particular, e correm maratonas nos quatro cantos, atrás e em cima do guarda roupa e na cozinha. Nada roubam, apenas esticam as patas, uma exima liberdade





Todos instintivamente querem se comunicar e eu querendo dormir. Enquanto eu me queixo da insônia prejudicial a minha mente, ouço barulhos de alguma festa que provavelmente encerrará com o nascer do dia. Num momento estou coberto dos pés a cabeça, depois estou girando na cama, sem cobertor, então me levanto, ando pelas dependências da casa escura, o chão e as paredes geladas. Insights, murmúrios, sussurros duvidosos do apartamento ao lado. Se eu atravessasse as paredes... Se eu flutuasse como a sacola lá fora... Tenho certeza que escreveria sobre tantas coisas que não vemos a essa hora.


Um gole de vinho e volto para o quarto com um copo d’água, sento-me na beira da cama, e olhando as horas, o relógio marcando 2h, repito comigo mesmo “O que estou fazendo a essa hora? Meu Deus, por que não dormi ainda? Esse sono que não chega... E tudo ainda se move, o dia não se esgota, tudo ainda se agita! A noite não dorme, eu não durmo, a noite passa e eu continuo”.

De onde vem esse sono que ainda não chegou? Em que estrada ele anda? Todos os dias se perde no caminho e só chega pela manhã me derrubando de vez. Meu Deus, se acaso ouves meus pensamentos, Tu que também não dormes, com o barulho de todos os planetas juntos, Senhor... Silencie tudo, silencie meus pensamentos, eu lhe peço. Já estou sufocando a caneta contra o papel em branco para fazê-la confessar até o último jato de tinta sobre tudo o que vejo, ouço e penso que parece não ter fim. Isso não é para mim. Não vivo somente para escrever, eu preciso de outros meios de sobreviver.

E o que faz o sol que demora tanto a chegar? Nos esqueceu visitando outras terras e nos deixou aqui sob a companhia da lua? Ela, a única que não diz nada, nem emite luz própria, mas fica de lá influenciando as marés e o cântico das matilhas. E esse pássaro da noite, que tanto grita? Coitado, também não consegue dormir.

Há outros escritores com insônia? Transiente, intermitente ou crônica, em qual estado estaria a minha? Essa agonia, essa angústia, esse estresse inconivente, essa ansiosidade desnecessária e essa expectativa à toa. Da vontade de cuspir tudo, porque parece estar tudo na própria garganta, ou no pulso ou no peito. E um gole d´água às 3h, mas eu gostaria mesmo era de mergulhar no silêncio aprisionado desse copo.

Já rabisquei tanto que não sei a ordem dos escritos no papel. Tem coisa escrita de cabeça pra baixo, de traz para frente, em todas as direções e nos rodapés. Daqui a pouco estarei a escrever pelo meu corpo, nas mãos, braços, rosto... Olhei agora a pouco no espelho e vi o cansaço em mim.

- “Queria tanto ajudá-lo” – disse minha imagem refletida no espelho e continuou “mas estou aqui dentro, num silêncio inesgotável”

- “Deve ser triste aí dentro” – comentei

- “Durante o dia você nada diz... mas se penteia, escova os dentes, faz caretas, procura defeitos, tenta corrigi-los, às vezes desiste, às vezes volta com cremes e máscaras, às vezes arrumado, outras vezes nu, se olha inteiro... Às vezes fixa tanto o olhar, como se fosse dizer algo... Mas só agora você...” – Confessou a imagem fazendo uma pergunta “Está sem companhia?”

Eu balancei a cabeça respondendo que “sim”, e após uns segundos, passei a mão no rosto e toquei o espelho. “Seus dedos estão úmidos”- comentou a imagem.

- “Deve ser o suor das minhas mãos” – disfarcei e interrompi a conversa sem deixar alguma palavra de despedida, afinal se essa insônia não passar, mais tarde estarei de volta, pois um novo dia começou, mas pra mim, é o mesmo trivial dia com a mesma pergunta “Hoje começo a nova vida?!”.

domingo, 11 de abril de 2010

Cinzeiro

Por Jefferson Acácio


Aqui, reduzido às cinzas do teu cigarro.
Produto das tuas chamas apagadas
Consumistes-me até os calos e valores
Sou metade do teu vício jogado fora
Sou as sobras e as sombras de cada hora

Aqui, essa labareda entreapagada
Que aspira pelo teu oxigênio para reacender
Mas é perigo que caias de novo no vicio
Mas consumir-me é tua função,
Venha cheio de voracidade e excitação.

Antes das cinzas eu sou o cinzeiro
Antes do cinzeiro eu sou o teu cigarro e fumaça esvaída
Antes da fumaça eu sou chumaço de fogo e faísca
Eu sou um amante que causa dependência química
Eu sou a própria química da tua vida absenteísta.

Foto Vinicius Neves(http://www.vestudio-portfolio.blogspot.com/)

Amor Primitivo

Por Jefferson Acácio

Cuidado, sou homem da caverna
Sou de lá da pré-história
Só conheço o amor primitivo
Sou do tempo da pedra

Escrevo nosso nome com fogo
Feito escravo me entrego acorrentado
De geração por geração, de selva em selva
Desde ancestrais comuns, evoluirei ao teu lado

Sou um indelinquente apaixonado
Fugindo desse planeta modernizado
E por ti sempre desarmado
Nada mais tenho, que o amor primata

Não sou nenhum diplomata de terno, gravata e indecências
Estou por cima da pele viva, transcendendo a própria carne.
Explodindo de nostalgia, de essencialidade,
Recusando amores da artificialidade!

Não quero um amor de relicário
Desses que enfeitam cartas e porta-retratos
Quero o amor de Primitivos, quero falar essa linguagem!

Arrependimento Mata?

Por Jefferson Acácio

O teu “não” desencadeou meus passos amedrontados para o asfalto
Sem cuidado invadi o trânsito que parou contra meu delito.
Enfurecido, continuaram as pernas na desordem e no perigo
Desmontando-me entrei no meu carro.
Retrovisor quebrado.
Peguei a chave, sem controle, encarei o volante.

Não era dia chuvoso mais liguei o pára-brisa.
Não era noite, mas acionei os faróis.
Carro e lágrimas em alta velocidade
Não estava embriagado, mas via tudo girar.

O “não” martelava na cabeça e eu mastigava-o na boca.
Ele era o fonema, meu combustível infinito fugindo da garganta aos soluços.
Eu seguia somente a sinalização na pista
E uma idéia fixa de delinqüente, dirigindo na contramão.
Sem freios cruzando as esquinas e bairros sem nome.
E na curva à direita não enxerguei as placas
O susto!...Outro carro!... E meu grito desesperado:
- Não!

Esse foi o pesadelo de uma noite perturbada
Quando o teu não me pareceu uma faca afiada
Ao acordar assustado, estava você ainda ao meu lado
Dizendo-me um “Sim” atrasado, constrangido
Então veio na minha cabeça uma pergunta
Que só a mim fazia sentido:
- Arrependimento mata?

Amor Introvertido

Por Jefferson Acácio



Fixamos o olhar e nossos disfarces se revelam.
Está implícita a exaltação de ânimos
Cada vez que nos encontramos
Nossas almas se amassam antes que o corpo confesse

Está claro que nos enamoramos escondidos
Numa intimidade em algum mundo paralelo
E não há resgate desse universo isolado
Intimados pelos julgamentos convencionados

Em plena modernidade, reside ainda o clero
E nossos sentimentos exilados dessa repressão
Cada sorriso nosso nos condena
Convivemos em cada suspiro etéreo

E nossas línguas se acariciam em ambientes esotéricos
E tudo se torna tão introspectivo
Um amor que se expressa cá dentro
Nesse peito envergonhado, achando que amar é pecado

Fixamos o olhar
É doçura
E habitamos num lugar
Onde se conservam o amor introvertido

Amor Calculado

Por Jefferson Acácio



Aprendi nos tempos de escola
Que a matemática está presente em tudo na vida
Eu ainda não tinha conhecimento da tabuada
E ainda apanhava de palmatoria para aprender a raíz quadrada

Muito eu treinava de tanto teste mal feito
Pelo menos a matemática do amor não podía ter defeito
Levei os cálculos à risca e aprendi o amor nas sentenças
A matemática não falha, pois que tudo é equilibrado

Então amor, nao duvide de mim quando lhe dou essa flor
Reconheça meu cálculo e minha lógica matemática
Somos produtos notáveis apaixonados!
Uma relação de pertinência, eu sou teu, e você é meu. (Ponto)

Não há como fugir dessa condição.
É adição e não subtração! É uma relação de inclusão!
Formamos um conjunto de intersecção que não se divide em frações tolas!
Nosso amor é unidade de medidas, proporções de mesma massa na balança.

Multiplique o mínimo de aproximação comum entre nós
E teremos conquistado o máximo de amor nos resultados.
Somos sistemas de equações simultâneas.
Desenhando juntos planos cartesianos num feixe paralelo de pernas.

Que bela composição de ângulos! Que enquadramento mágico na cena!
Resolva as sentenças abertas com duas variáveis:
- Ou leva zero no meu teste de apaixonado... Ou se entrega à fórmula natural do amor!
Não trago nenhum castigo pela sua nota
Ainda apanho igualzinho como na escola
Pois ainda estou aprendendo as regras do amor calculado

Alto-Programada

Por Jefferson Acácio

Não sou alto-programada!

Lava, enxuga, dobra e passa
Escuta e obedece, executa e agrada

Não sou alto-programada!

Que empresta meu corpo à cama
Que empresta minha boca ao teu beijo
Nem que empresta minhas ancas ao teu deleite

Não sou alto-programada!

A qualquer momento posso precisar de gestos mais sensíveis
Um casamento não pode se limitar às tarefas domésticas
E a cama não pode se limitar ao descanso da carne

Não sou alto-programada!

Pelas manhãs, não basta dizer de longe, apressado – Tchau, te amo!
Quem disse que o maior compromisso é a casa?
Antes de lavar os pratos, o banheiro, as roupas...
A faxina começa com um beijo de sugar a alma.

Pois é, não sou alto-programada!

Do Big-Bang ao Bang-Bang

Por Jefferson Acácio

O iluminismo das velas, terços e patuás.
Sinalizam a procissão se aproximando
Maquiagem natural de sofrimento no rosto
Vestígios de trabalho desenhados na mão

Mãos cravadas ao rosário
Acompanham o menino Jesus
Mãos firmes, no símbolo,
Carregam a cruz


Signos de morte na romaria
Existencial de vidas póstumas
Seguem em busca ritual
Da pós-fome, pós-sede, pós-carne, pós-alma.

Sagrada romaria de fé
Esse é o espírito tradicional
Enraizado no mundo materialístico
Onde o poder do homem robótico é mais holístico

Do big-bang ao bang-bang
Assistimos confortáveis no sofá
Homens compressos e miúdos
Em cenas esmiuçadas na TV

Guerreando por lucros entre as nações
Manifestando o luto nas emoções
E a luta de todos nós
Sobrevivendo à aventura lunática

Tomamos comprimidos
Para não regurgitar
Ingerimos toxinas de ganância e ódio
Injetamos venenos de prazer para no remediar


Respirar, voar, nos locomover...
São valores meramente convencionais
Estamos cada vez mais convencidos
Que a realidade de viver é consumir a vida

A propina empina o nariz e ensina
Que Deus é dinheiro no bolso
E muito dinheiro no bolso
É plástica no nariz

Assim, entramos numa cegueira coletiva.
Que nos impõem as imagens televisivas
Imaginem que ate mudo ficamos
Para não resmungar

Estamos regredindo ao tempo zero
Regularizando os parafusos industriais da cyberlogia
Se adaptando às condições
Da nova hipocondria social

Viva à antropofagia entre os homens cegos!
Viva ao homem entrando no pântano!
Viva as nossas prisões pessoais!
Viva cada vez mais aos carnavais!

Armaram um atentado para o amor
É o terrorismo entre os homens
Erguendo os muros altos de Berlim
E fazendo fronteiras pelas terras-do-sem-fim!

Solidificando-se...
Compressando-se...
Com pressa voltando à caverna
Escura e lodosa de Platão

Filas plantão nos hospitais
Para ver Madalenas apedrejadas
Para fotografar Joana D’Arc queimada
Rir do Judas condicionado à corda proposital

Estamos a um passo da cova
Covardes que somos,
Esquecemos Lutero
E pagamos indulgências pelo paraíso eterno

É que inventaram que existe
Imposto ate no céu
E o orçamento do purgatório
Parece estar em promoção

Que SUS-to! E vejo filas enormes
Parece o SUS!
Voltem depressa para a estrada
Certa e segura das romarias de JE-SUS!

Regozijem-se da herança prometida
Nas profecias de João
Porque o tempo... Ao contrario de Cazuza:
- O tempo pára!


VERSÕES MENORES:



Do Big-Bang ao Bang-Bang


O iluminismo das velas, terços e patuás.
Sinalizam a procissão se aproximando
Maquiagem natural de sofrimento no rosto
Vestígios de trabalho desenhados na mão

Mãos cravadas ao rosário
Acompanham o menino Jesus
Mãos firmes, no símbolo,
Carregam a cruz

Signos de morte na romaria
Existencial de vidas póstumas
Seguem em busca ritual
Da pós-fome, pós-sede, pós-carne, pós-alma.

Sagrada romaria de fé
Esse é o espírito tradicional
Enraizado no mundo materialístico
Onde o poder do homem robótico é mais holístico

Do big-bang ao bang-bang
Assistimos confortáveis no sofá
Homens guerreando por lucros entre as nações
Manifestando o luto nas emoções

Estamos a um passo da cova
Covardes que somos,
Esquecemos Lutero
E pagamos indulgências pelo paraíso eterno

É que inventaram que existe
Imposto ate no céu
E o orçamento do purgatório
Parece estar em promoção

Regozijem-se da herança prometida
Nas profecias de João
Porque a qualquer momento
Passaremos dessa aventura como poeira no espaço!

Cegos no pântano!


Respirar, voar, nos locomover...
São valores meramente convencionais
Estamos cada vez mais convencidos
Que a realidade de viver é consumir a vida

A propina empina o nariz e ensina
Que Deus é dinheiro no bolso
E muito dinheiro no bolso
É plástica no nariz

Armaram um atentado para o amor
É o terrorismo entre os homens
Erguendo os muros altos de Berlim
E fazendo fronteiras pelas terras-do-sem-fim!

Filas de plantão nos hospitais
Para ver Madalenas apedrejadas
Para fotografar Joana D’Arc queimada
Rir do Judas condicionado à corda proposital

Viva à antropofagia entre os homens em suas prisões pessoais
Compressando-se com pressa de volta ao lamaçal
Viva a Platão e o mito da caverna escura e lodosa!
Viva aos homens lutando pela sobrevivência no pântano da cegueira existencial!